Não esperava voltar ao assunto. O conflito. Palestino-israelita. Porque continuo a ver e a ouvir muitos entendidos a falar do que não sabem, falam por falar. E porque sobre o conflito, li ontem no JN um artigo de opinião escrito por alguém que sei ser insuspeito. Porque anda para aí muita gente a falar e a escrever sobre o que não sabe. A estes, sobretudo aos que se dizem politicamente de esquerda, aconselho-os a consultar um estudo documentado sobre a Palestina e as suas origens, da Comissão Justiça e Paz, de 2002. Não me consta que esta Comissão seja politicamente de direita. O artigo que li é do jornalista Manuel António Pina, intitula-se "O ladrão e a vinha" e consta da sua coluna de opinião "Por outras palavras". E não me consta que Manuel António Pina seja politicamente de direita. Com a devida vénia ao jornalista, e pedindo-lhe desculpa pela ousadia deste pobre escriba, passo a transcrever:
"A Comissão de Direitos Humanos da ONU condena "firmemente" a agressão israelita em Gaza e exige a "retirada das forças israelitas". A resolução cita 16 vezes Israel e as agressões israelitas contra os direitos humanos do povo palestiniano. Quanto ao Hamas, é como se não existisse; mesmo os "rockets" sobre civis israelitas, citados timidamente uma vez, não têm autor. A sessão foi convocada por Cuba, em nome do Movimento dos Não-Alinhados; Egipto, em nome do Grupo Árabe e Africano; e Paquistão, em nome da Conferência Islâmica, tudo gente respeitadora dos direitos humanos. O Canadá votou contra, e entre outros, abstiveram-se os países da UE, o Japão e a Suíça. A resolução acabou, no entanto, por ser aprovada com os votos dos proponentes e outros países justificadamente conhecidos pelo "firme" respeito que dedicam aos direitos humanos, como Angola, China, Arábia Saudita, Rússia, Indonésia, Jordânia, Gabão ou Azerbeijão. A Human Rights Watch já criticou a decisão, dizendo que, ao focar apenas Israel, A Comissão "destrói a sua credibilidade". É o que acontece quando é o ladrão quem guarda a vinha." Por aqui me fico. E deixo alguns poemas sobre guerra
A BOMBA
O primeiro sopro arrancou-lhe a roupa;
o0 imediato levou também a carne.
Ao longo da rua
durante alguns segundos correu o esqueleto.
Mas a rua já não estava,
estava toda no ar;
de lá caíam bocados de prédios, bocados
de crianças, restos de cadilaques...
O esqueleto não compreendia sozinho
aquela situação:
deixou-se tombar sobre algumas pedras radioactivas
e permitiu na queda o extravio de alguns ossos.
(Caso curioso: o coração
pulsou ainda três ou quatro vezes
entre o gradeamento das costelas.)
Egito Gonçalves
NENHUMA GUERRA É A TUA GUERRA
Nenhuma guerra é a tua guerra,
porque nenhuma guerra tem ou conhece dono,
animal bravio ceifando pétalas
enquanto as estrelas, indefesas,
viram, atónitas, as costas à luz.
A guerra é a nossa doença,
a manhã tempestuosa e ácida
em que tudo definha e morre
por não saber que nome há-de dar à vida.
Nenhuma guerra é a tua guerra
porque tu tens nos cabelos
a breve centelha de lua
que faz do que sonhas
o último domínio que a esperança consente.
José Jorge Letria, in Poemas da Linha da Frente, Editora Ausência, 2003
BALADA INGÉNUA SOBRE AS BOMBAS INTELIGENTES
Se as bombas inteligentes
fossem mesmo inteligentes
não eram bombas.
Eram fraldas descartáveis,
meias de ligas,
sandálias,
cafeteiras, fósforos, colheres,
lenços ao pescoço,
búzios na areia,
lençóis de linho,
livros de poesia,
coisas úteis, verdes, brancas,
coisa de água e vento.
Se as bombas inteligentes
fossem mesmo inteligentes
eram flores,
simplesmente flores,
sem simbolismos nem lirismos,
flores concretas
a tremer no ar tépido da tarde,
flores com abelhas a zumbir à volta,
flores azuis, nascidas da terra,
flores amarelas, roxas, violetas,
margaridas, cravos, miosótis,
rosas repetidas
para além de todas as evidências.
Se as bombas inteligentes
fossem mesmo inteligentes
explodiam ininterruptamente
em cada Primavera
e mesmo que não fosse Primavera
explodiam
pelo simples e desvairado prazer
de lançar em todas as direcções
ogivas carregadas
de brisas cantantes,
águas felizes
e pólen.
José Fanha, in Poemas da Linha da Frente, Editora Ausência, 2003
1 comentário:
Pois...!
A guerra!
Nunca há um vencedor, um perdedor e muito menos uma razão.
Mas...
Quando penso nos Israelitas inocentes que vivem todos os dias com medo que um rocket lhes entre pela casa dentro, penso no que faria para me defender.
O "hamas" mata inocentes por vontade própria, quantos mais melhor, Israelitas e até Palestinianos para os mostrar na T.V. Os israelitas matam inocentes, sem querer.
Há uma diferença.
Mas, que se lixem os "danos colaterais".
Os inocentes é que sofrem.
Sem dúvida, mas não é essa a condição humana!?
Onda há dois homens, há um conflito.
Somos assim. Ponto.
Claro que não nos resignamos.
Eu não sou assim!
Milhões de outros não são.
Até ao dia, em que REALMENTE somos postos á prova...
Espero sinceramente, nunca o ser.
O pior de mim, seria concerteza exponencialmente maior do que o melhor de mim.
Pedro.
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