Pois, a tecnologia tem destas coisas. E para quem não está suficientemente dentro dela, pior. O escrito anterior, mercê das manigâncias técnicas, não ficou completo, porque a malvada maquineta se recusou a abrir o blog. Problema que só hoje (espero), depois de inúmeras tentativas, ficou resolvido. O post deveria comportar uma declaração de intenções e acabar com um poema.
Declaração de intenções: nunca tive, não tenho e não terei qualquer filiação partidária. Quanto ao Governo, seja ele qual for, - e embora concordando que nem tudo é mau na governação - sou sempre contra. Também em tempos escrevi num jornal, apesar de não ser jornalista. E nem de propósito esta adenda, uma vez que hoje foi também o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa
Agora o poema:
TEMPO DE CALÍGULA
Calígula era um indivíduo admirável
dentro da sua casaca preta
por isso os senhores que habitavam o palácio de Calígula
se tornavam subitamente admiráveis
dentro das suas casacas pretas
tão admiráveis
que se acaso Calígula falava
só o eco das palavras semeava de espanto
o coração de todos
e se Calígula sorria
ainda que fosse discretamente
todos sorriam discretamente
(de outra maneira, é lógico, deixariam de ser admiráveis)
e em cada palavra, cada sorriso
os insígnes jornalistas do palácio
anunciavam uma ideia admirável
para os destinos bíblicos de Roma
mas os anos foram continuando os séculos
e Roma era apenas uma pátria
sem tempo e sem destino
assim como um relógio antiquíssimo
a que Calígula não tivesse dado corda
porquê então os sorrisos de Calígula
e dos senhores subitamente admiráveis
dentro das suas casacas pretas?
soube-se mais tarde, isto é,
após a morte de Calígula
que Calígula só era um indivíduo admirável
dentro da sua casaca preta
por saber contar anedotas admiráveis
aos senhores subitamente admiráveis
por saberem sorrir às anedotas de Calígula
então o povo disse
que quem contava anedotas admiráveis
eram afinal os jornalistas do palácio de Calígula.
Fernando Guedes in Caderno "Poemas livres" n.º 1 - Março de 1962
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