Ontem não houve poema de Natal, já que tive que cumprir o ritual de um dia dedicado à cultura. Primeiro foi a apresentação do livro "O meu menino Jesus", transcrição parcial, porque mais direccionada para a juventude, do 8º poema do "Guardador de Rebanhos" de Alberto Caeiro/Fernando Pessoa, numa edição da Seara de Letras. Depois, à noite, estive no Auditório de Gaia, onde assisti à peça «Jornada para a noite» pelo Teatro Experimental.Texto fortíssimo, servido por bons actores.
Justificada a falta, vamos ao poema para hoje, do poeta David Mourão- Ferreira.
NATAL UP-TO-DATE
Em vez da consoada há um baile de máscaras
Na filial do Banco erigiu-se um Presépio
Todos estes pastores são jovens tecnocratas
Que usarão dominó já na próxima década
Chega o rei do petróleo a fingir de Rei Mago
Chega o rei do barulho e conserva-se mudo
enquanto se não sabe ao certo o resultado
dos que vêm sondar a reacção do público
Nas palhas do curral ocultam microfones
o lajedo em redor é de pedras da lua
Rainhas de beleza hão-de vir de helicóptero
e é provável até que se apresentem nuas
Eis que surge no céu a estrela prometida
Mas é para apontar mais um supermercado
onde se vende pão já transformado em cinza
para que o ritual seja muito mais rápido
Assim a noite passa. E passa tão depressa
que a meia-noite em vós nem se demora um pouco
Só Jesus no entanto é que não comparece
Só Jesus afinal não quer nada convosco
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