quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Desejo improbável



Na passagem de ano, nos habituais desejos que todos acalentamos, surgem por vezes algumas ideias tolas que nunca viremos a alcançar ou a concretizar. Foi o que nesta passagem de ano me aconteceu. Desejei ter para mim o  poder absoluto, ainda que só por um dia. Para poder, por exemplo, ordenar que toda a gente lesse poesia. Se tal não fosse possível, para que ao menos toda a gente pudesse saborear o gosto da poesia, eu
"dava um verso de Neruda a cada desempregado, um de David Mourão-Ferreira a todas as mulheres sem amor, um de Florbela Espanca aos homens distraídos, um de Lorca aos poetas que deixaram secar a maravilha das palavras, um de Cesário aos condutores da Carris com olhos cheios de Tejo, um de Vinícius aos alcoólicos anónimos que dançam sobre o chão da sua imperfeição, um de Sebastião da Gama a cada professor que não se deixa encerrar em 4 paredes e três relatórios, um de Prévert aos gatos que caminham como imperadores no alto dos telhados, um de José Craveirinha a todos os cantores de RAP, um de Gomes Leal aos que naufragam em caixotes pelos cantos da cidade, um de Ferlinghetti aos saxofones que nos fazem subir ao céu, um de Ruy Belo aos que acreditam que ainda tudo é possível, um de Eugénio aos que choram abraçados a uma macieira, um de Sophia aos que habitam o esplendor do mar, e um da Matilde Rosa Araújo a todas as crianças do mundo.

O magnífico texto em negrito é parte de um post que fui "roubar" ao blog Queridas Bibliotecas, do José Fanha, a quem presto a minha homenagem. Gostava de ter sido eu a escrevê-lo. O meu obrigado a este "irmão" na divulgação da poesia pelas escolas.

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