sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Há gajas ou não há gajas?


Este ano de 2011 está quase quase a acabar. Se estendermos o nosso braço, a mão já quase consegue agarrar o 2012. Posto isto, pareceu-me bem, trazer até aqui uma pequena história com um ligeiro toque de brejeirice. Preparem-se, carantonhas, para ler a história da reunião magna na selva para anunciar o programa das festas comemorativas do aniversário do Rei Leão. E para vos saber melhor podem ouvir, do Carnaval dos Animais, do compositor francês Camille Saint-Sans a introdução e marcha do rei Leão. Não será a interpretação com mais pompa, mas é de certeza uma das mais curiosas.
Vamos então à história.

LEÃO (dirigindo-se à assembleia) Bem, meus amigos, as festas vão durar três dias, e no primeiro dia vamos ter exercícios de trapézio por uma parelha de macacos vindos expressamente de...

SAPO (interrompendo, do fundo da sala) Então...e gajas? Há gajas ou não há gajas?...

LEÃO (ainda mal refeito da ousadia do batráquio) Bem... E como eu ia a dizer, vamos ter um segundo dia bastante animado com cobras, tigres, elefantes e...

SAPO (interrompendo, de novo, com determinação) Mas o que é que essa merda interessa? Gajas é que conta. Há gajas ou não há gajas?

LEÃO (já completamente lixado, com f) Bem... o terceiro dia será uma grande apoteose, com banquete, orquestra e fogo de artifício.

SAPO (ainda mais inquisidor) Então... mas só isso? Não ouvi falar em gajas! Há gajas ou não há gajas?

LEÃO (prestes a saltar) Bom...obrigado por terem vindo. Está encerrada a sessão. Podem sair todos, com excepção daquela coisa verde e rastejante que está lá atrás, e vai ficar feita em merda!

SAPO (desafiando completamente a autoridade da monarca) Daasss pá!!! Deixa lá a merda do crocodilo! Há gajas ou não há gajas?
  
Depois da história que, espero, vos tenha feito pelo menos sorrir, aconselho a que ouçam o Carnaval dos Animais, completo. 

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

A morte do Pai Natal

Já aqui deixei escrito num dos anos passados, que o meu Natal é o do Menino Jesus. O Pai Natal- personificado por São Nicolau, bispo de Esmirna, na Ásia Menor -, é um costume que nos chegou através dos povos do norte da Europa. E para nossa desgraça, (pelo menos minha), a coca-cola apossou-se dele e vestiu-o de vermelho. Por tudo isso, e também pelo gutural e idiota wow, wow, wow, vou matar o Pai Natal, que alguém, sem o meu assentimento, já matou no Facebook.

A MORTE DO PAI NATAL

Era um pai Natal barrigudo, com longas barbas brancas e um fato vermelho com capuz. Vivia no Pólo Norte e tinha um trenó puxado por seis renas.
Uma noite de Natal, andando ele a distribuir brinquedos, pousou o seu trenó no telhado coberto de neve de uma casa de lousa. Como a chaminé era estreita e o pai Natal não cabia, resolveu descer e bater à porta.
- Quem é? – perguntaram de dentro vozes de criança.
- É o Pai Natal.
- Não pode ser.
- Sou, sou.
- O Pai Natal não existe.
- Existe sim! Sou eu!
- …e nós somos órfãos.
- Coitadinhos!
- E se és o Pai Natal, porque vens bater à porta em vez de entrares pela chaminé?
- Porque a chaminé é estreita e a minha barriga muito grande.
- Balelas! Tu é que não és o Pai Natal!
- Sou eu, sim! Abram-me a porta! Deixem-me entrar!
- Se és o Pai Natal e queres entrar, entra pela chaminé.
O Pai Natal não teve outro remédio. Se queria que acreditassem nele, tinha de entrar pela chaminé. Subiu de novo ao telhado. Despiu a roupa toda e untou o corpo com manteiga, para escorregar melhor. Saltou.
Splash! Em cheio na panela que estava ao lume!
Nunca os meninos tiveram um Natal tão feliz!
Rui Souza Coelho, Fernando Pessoa contra o Homem Aranha,

Irmãos CARANTONHAS, para todos, votos de um BOM NATAL (o melhor que vos for possível).



quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

A ceia




Um conto de Natal, escrito (como só ele sabe) pelo meu amigo e colega, Nelson Ferraz

A CEIA

«O miúdo
(de gatas)
foi junto da árvore e espreitou
parede acima

depois sentou-se
ajeitou a chupeta num quarto de volta
para a direita
endireitou duas encorrilhas da fralda
treinou a cara de mau número cinco
e gatinhou mais dois centímetros
para a esquerda
depois parou em frente ao presépio chinês
e olhando o burro nos olhos perguntou:
- gu da gu gu da gu?
cinco segundos depois tornou a perguntar:
- gu da gu gu da gu?
dez segundos depois outra vez:
- gu da gu gu da gu?

nesse Natal o burro faltou à ceia»

Perguntas a serem respondidas por quem quiser: - o que é que aconteceu ao burro? Era de chocolate e o miúdo comeu-o? Era de barro e o miúdo partiu-o? Ou já cansado da pose estática de tantos anos, sempre com a mesma ração de palha, a bafejar o Menino, -  filho de pai carpinteiro "que não era pai dele" e de uma mãe que "não tinha amado antes de o ter./Não era mulher:era uma mala/Em que ele tinha vindo do céu"? - se tornou também outra vez menino e ficou a brincar com o miúdo?

gu da gu gu da da?

*O texto em itálico é de Alberto Caeiro

                                                              

sábado, 17 de dezembro de 2011

Um outro Natal

O texto aí em baixo é da autoria do meu saudoso amigo, companheiro de tantas jornadas, Joaquim Castro Caldas. Com a sua irreverência, rebeldia e iconoclastia, dá-nos uma outra visão do Natal, sem nunca nos falar no Natal.
E conhecendo-o como o conheci, não me espantaria que andasse all night long, de mão dada com Jesus, a tentar convencê-lo a tornar-se humano outra vez - "damo-nos tão bem um com o outro/na companhia de tudo/que nunca pensamos um no outro."*  "Ao anoitecer brincamos às cinco pedrinhas/No degrau da porta de casa,/Graves como convém a um deus e a um poeta,.../* Até porque "Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro./Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava./Ele é o humano que é natural,/Ele é o divino que sorri e que brinca./E por isso é que eu sei com toda a certeza/Que ele é o Menino Jesus verdadeiro."*

*As partes do texto em itálico são versos do VIII poema do Guardador de rebanhos de Fernando Pessoa (Alberto Caeiro)

PINÓQUIO AOS SEUS INIMIGOS

Sim, sou um boneco, mas vivo e de boa madeira, viva, arrancada às árvores ainda cheias de seiva, muito senhor do meu nariz que cresce e tudo. ao contrário do que a vossa imaginação prodigiosa acha que pareço, não sou pau santo mandado, mas teca mágica. tenho com o menino Jesus um único ponto em comum: pai carpinteiro. mas Gepetto é mesmo meu pai e se convém, até a minha mãe. S. José não passa do aio adoptivo do seu herói ingrato: o menino Jesus crescido nunca mais foi visitá-lo depois de seguir o seu destino. sim, se bem que mártir voluntário, o menino Jesus teve um destino, eu tenho um caminho. nunca abandono as minhas origens, conforto-as sempre que posso ou que o meu sonho acordado pára para respirá-las. por causa da minha liberdade haverá sempre um carpinteiro com posto de trabalho, prenhe do meu desejo antecipado. e que sem lágrimas nos olhos me respeita a aventura e o desapego, pelo que me dirijo ao Povo de Deus e não ao rebanho do Senhor. pelo que sou imortal, o menino Jesus é apenas eterno: disse muitas verdades na terra mas ninguém o levou a sério; só quando os homens lhe alteraram as verdades é que foi manipuladamente reconhecido. Antes disso foi crucificado numa cruz feita da mesma madeira de que sou feito. como a arca de noé, a vara de moisés, o cavalo de tróia, ou a lança de don quixote. sou um pastor de histórias que as perde à medida que as vai contando, quem quiser que acredite. quando minto não escondo, o nariz cresce-me e toda a gente vê que minto, as minhas mentiras inofensivas são sementes de fantasia e desassossego. não sei quem é mais de carne ou menos de osso. porque o menino jesus é um boneco na vossa mão e muitos de vós meus bonecos são. porque eu só sou um poeta e a imagem e a memória do menino Jesus fazem a vossa política e servem a vossa razão. Onde estão a verdade e a mentira? nos homens. a única grande diferença é que eu estou cá para me defender e o menino Jesus não.

                                                                                              JCC (que é o mesmo que dizer, Joaquim Castro Caldas).
Este é  o meu presente de Natal para ele, pois não sei se se lembrará ainda deste texto.

Que Natal?


AMANHÃ É NATAL

A neve ouviu aos ventos: «É Natal»
E revestiu planícies e montanhas
De brancura ideal.

As árvores sentiram: «É Natal»
E balançaram ramos resplendentes
Num bailado irreal.

As aves escutaram: «É Natal»
E envolveram os campos e as almas
Num canto sem igual.

Os astros escreveram: «É Natal»
E inundaram a terra sua irmã
Duma luz celestial.

Os anjos repetiram: «É Natal»
E trombetas e vozes se expandiram
Num coro divinal.

Os homens exultaram: «É Natal»
E comeram, comeram, comeram
Até fazer mal.

Francisco Ventura

Este é o Natal da volúpia, da gula e do consumismo. Amen (isto é, assim seja). Cumpra-se, mesmo em crise, a vontade dos deuses.

Francisco Ventura, escritor. Mais conhecido como autor teatral do que pela sua poesia. O seu teatro, muito próximo do auto de tradição vicentina, é de inspiração rústica, pedagógico e moralizante.

Caros carantonhas, bom fim de semana (para aqueles que podem gozá-lo). E leiam, leiam, sem que vos faça mal. Amen.


                                                        

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Aula de catecismo

AULA DE CATECISMO

No primeiro dia o homem criou Deus
À medida das suas expectativas

No segundo
Para festejar a nova criatura
Semeou as borboletas e os astros

No terceiro dia
Deus começou a crescer
Para além do previsto,
E no quarto nasceu o diálogo.

Ao quinto dia soltou-se a violência
E no sexto a guerra e as catástrofes
Presidiram aos actos seculares.

No sétimo dia descansou
E os crentes começaram a vender
As acções do Vaticano

Mário Ferreiro poeta uruguaio, é o autor do poema.A tradução  é minha. Pareceu-me oportuno publicá-lo nesta altura do ano. Deixo os comentários e as extrapolações aos caros carantonhas que de vez em quando me visitam aqui.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Já se puseram a caminho. Hão de chegar lá mais para o principio do próximo ano. Ensinaram-nos que eram os Reis Magos. Mentira. Seriam mercadores ou sábios astrólogos. Vinham do leste, ou do oriente, como diz a tradição. E é por me lembrar o oriente (podia ser por qualquer outra razão) que coloquei aqui esta fotografia. Mas não, não retrata qualquer sítio do oriente. É simplesmente um pôr do sol, em dezembro, na praia da Costa Nova.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Gato brincalhão


Porque me lembrei de uma certa gata (des)construtora que mora numa urbanização em Aveiro.

Entre les deux...


"Entre les deux mon coeur balance" que é como quem diz, podem vir os dois - tango ou flamenco - que eu gosto. E como daqui a pouco, mais ou menos a meio da manhã, vou ter que me submeter a um exame ao coração, vou bem acompanhado, até porque também gosto do Paco de Lucia. Até mais logo.

sábado, 3 de dezembro de 2011

No país dos sacanas

Vá lá, em que país estavam a pensar ao ler o título? Pois, é esse mesmo. É, é esse mesmo país no qual os que nos governam, fingem não saber quanto são sacanas. Para vosso gozo aqui fica o poema de Jorge de Sena.

NO PAÍS DOS SACANAS

Que adianta dizer-se que é um país de sacanas?
Todos o são, mesmo os melhores, às suas horas,
e todos estão contentes de se saberem sacanas.
Não há mesmo melhor do que uma sacanice
para poder funcionar fraternalmente
a humidade da próstata ou das glândulas lacrimais,
para além das rivalidades, invejas e mesquinharias
em que tanto se dividem e afinal se irmanam.

Dizer-se que é de heróis e santos o país,
a ver se se convencem e puxam para cima as calças?
Para quê, se toda a gente sabe que só asnos,
ingénuos e sacaneados é que foram disso?
Não, o melhor seria aguentar, fazendo que se ignora.
Mas claro que logo todos pensam que isto é o cúmulo da sacanice,
porque no país dos sacanas, ninguém pode entender
que a nobreza, a dignidade, a independência,
a justiça, a bondade, etc., etc., sejam
outra coisa que não patifaria de sacanas refinados
a um ponto que os mais não são capazes de atingir.

No país dos sacanas ser sacana e meio?
Não, que toda a gente já é pelo menos dois.
Como  ser-se então neste país? Não ser-se?
Ser ou não ser, eis a questão, dir-se-ia.
Mas isso foi no teatro , e o gajo morreu na mesma.

Carantonhas, desfrutem bem do vosso domingo, se possível com leituras e ,se não for pedir muito, lendo poesia.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Café com leite fatídico

Quando há dias seleccionava uns papéis, veio-me à mão um texto surrealista de Max Aub, que me fez recordar o que um dia, num café, se passou comigo. Normalmente tomo, seja café, chá ou leite, sem açucar, mas por hábito mexo a bebida, pois fico com a sensação de que com esse gesto a arrefeço.
Entrei, pedi um café e quando fui servido lá me entretive a mexer. Ao meu lado estava um cliente que reparou no gesto, e dirigindo-se-me, disse-me que me esquecera de pôr o açucar.Agradeci e lá tive que explicar o gesto. 
E são horas de vos deixar o texto de Max Aub.

"Começou a mexer o café com leite, com a colherzinha. O liquido quase transbordava da chávena empurrado pelo movimento do utensílio (o recipiente era vulgar, o sítio era ordinário e a colher estava arredondada pelo uso). Ouvia-se o barulho do metal contra o vidro. Tim, tim, tim, tim. E o café com leite girava, girava, com uma cova no meio. Um maelstrom. E eu encontrava-me sentado mesmo à frente. O café estava à pinha. O homem continuava a mexer, imóvel, e sorria a olhar-me. Senti umas coisas a subir por mim acima. Fitei-o de tal maneira que se sentiu na obrigação de me explicar:
- O açucar ainda não está derretido.
Para mo provar, bateu várias vezes com a colher no fundo do copo. Recomeçou a mexer metodicamente a beberagem, com uma energia redobrada. Voltas e mais voltas sem parar, eternamente. Voltas e mais voltas e mais voltas. E continuava a olhar para mim sorrindo.
Então, puxei da pistola e disparei".

MAX AUB nasceu em Paris em 1903, filho de pai alemão e de mãe francesa.Mudou-se para Valência em  1914, com o eclodir da primeira Grande Guerra, tendo então adoptado o espanhol com língua de criação. Viveu no México mais de 30 anos, onde faleceu em 1932. Novelista, dramaturgo, ensaísta e poeta

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Tudo começou quando...

Tudo começou quando o Todo Poderoso lançou o nosso globo no espaço e lhe chamou Terra. Pois é: tudo começou com um lamentável erro de denominação. Como é que se compreende chamar Terra a um planeta que na sua composição é dois terços líquida? É evidente que a Terra devia chamar-se água. Depois de fazer o dia, a noite as árvores e os minerais, Deus fez todos os animais. Isto é, todos não! Basta a gente olhar pró camelo para perceber que aquilo é uma obra de  grupo. Depois de fazer todos os animais, Deus resolveu fazer o primeiro homem. E fez. Mas como não registou a invenção, hoje qualquer idiota se acha no direito de fazer o mesmo. Agora, reparem que Deus era um tipo realmente modesto: ao fazer o 1º homem, fez Adão, um tipo bronco, um simplório, em suma, um camponês analfabeto. Pergunto muitas vezes a mim próprio porque é que, com o seu poder, não fez um general de 4 estrelas?**

Pois é, não fez um general e voltou a errar. Fez um coelho passeante, um relvinhas, um porteiro, um  vitorino au ralenti, um macedónio, e outros equivalentes. Em suma, fez uma salada podre que vamos ter que engolir por muito tempo, com muitas dores de estômago e de cabeça.

** Texto de Millôr Fernandes


sábado, 12 de novembro de 2011

Formosura

Hoje, para um fim de semana bem disposto, apetece-me reincidir com poesia de Augusto Gil.
Aqui vai:

Mater pulchra filia pulchrior*

Entraram na conversa a filha e a mamã.
A mãe era bonita. A filha era-o também.

- Esta senhora é sua irmã?
Disse eu interrogando a mãe.

E a mãe teve um sorriso de contente,
E a filha um sorrisinho de quesília...

- Que coisa comovente
É o amor de família!...

*pulcritude: beleza; formosura

Augusto Gil nasceu no Porto (Lordelo do Ouro) e faleceu na Guarda, cidade beirã onde viveu a maior parte da sua vida. Advogado formado pela Univ. de Coimbra, foi Director Geral das Belas Artes  e dirigiu vários jornais, onde escreveu. Foi influenciado pelo Parnasianismo e Simbolismo, e a sua poesia insere-se numa perspectiva neo-romântica.

Carantonhas, tenham um bom domingo e por favor leiam poesia.

Uma fotografia

Nos meus arquivos fui encontrar esta bela fotografia. A fotografada, em pose com o seu quê de mistico, não é  a "jovem Lília abandonada", mas lá que parece, parece, "estar pedindo a Deus: -
Ao menos um alferes de infantaria!...
Nada disso. O que atrás fica dito é o pretexto para deixar aqui um pequeno poema de Augusto Gil, do seu livro "O canto da cigarra - sátiras às mulheres". A fotografada é a minha amiga Ana, excelente fotógrafa, que também diz e escreve bem poesia.

Jovem Lília abandonada

Sempre que a vejo a contemplar os céus
Com ar de lírica neurastenia,
Dá-me a impressão de estar pedindo a Deus:
- Ao menos um alferes de infantaria!...

Carantonhas, tenham um bom fim de semana, de preferência relaxados e lendo boa poesia.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

São Martinho

No São Martinho prova o teu vinho/No São Martinho bebeo vinho deixa a água para o moínho/No São Martinho come-se castanhas e bebe-se vinho/Pelo São Martinho comem-se castanhas e bebe-se vinho.

Estes são alguns dos muitos provérbios alusivos a quadra de São Martinho que associam as castanhas ao vinho. Castanhas porque estamos no tempo delas e fazem um bom lastro para o vinho novo que se presume estar pronto para ser bebido.
Mas o santo deu origem também a outros provérbios que nada têm a ver com castanhas e vinho.Todos conhecerão o "verão de S. Martinho são três dias e mais um bocadinho". Este ano o São Martinho não foi de sol mas de chuva, dando razão ao provérbio que nos diz que "se o inverno não erra o caminho, te-lo-ei pelo S. Martinho".
A sabedoria popular não deixa passar a data em vão, e vai daí a veia poética do povo solta-se e as quadras ao santo são inúmeras. Umas mais moralistas outras mais irónicas ou satíricas. Aqui ficam algumas.

Se a palavra riqueza
S. Martinho fosse tua
De certeza que pobreza
Não andaria na rua

S. Martinho amou sorrindo,
Tanto os ricos como os pobres
Despiu a capa, vestindo
Os sentimentos mais nobres

Só quero p´ra namorada
Mulher feita, S. Martinho.
- Da uva bem sazonada
É que sai o melhor vinho.

No dia de S. Martinho
Olhei-te e não te esqueci.
Fui à feira atrás do vinho,
Vim da feira atrás de ti.

Se quem bebe muito vinho,
S. Martinho, faz pecado,
Tenho o inferno certinho,
Mas vou p´ra lá consolado

Deu S. Martinho o capote
Ao pobre, por caridade.
Se ele visse o teu decote
Dava-te ao menos metade.

S. Martinho, vem cá baixo
Pois senão isto dá "raia",
Anda dar a tua capa
Às moças de mini-saia.

S. Martinho se viesse 
A este mundo outra vez,
Não tinha pano que desse
P´ra tapar tanta nudez!

Quando vais ao S. Martinho
Com trajes indecorosos,
Os olhos do bom santinho
São dois discos luminosos.

Gostaram? Desfrutem. Até amanhã.

Olha a capícua

Onze de Novembro de 2011. Dito ou escrito assim demora um pouco.Na escrita, para abreviar, escrevemos a capícua, 11-11-11.  Há quem acredite que as capícuas trazem azar, mas há também os optimistas que acreditam que estas são de bom augúrio. O dia de hoje passado,quer acreditem ou não nos bons ou maus augúrios das capícuas, descancem os espíritos porque só daqui a mil anos a capícua se repete. Nos anos 11 dos centenários não há capícua, ou se se quiser ser benevolente poderemos dizer que é uma capícua imperfeita. E não é que por sorte ou azar escrevi sete vezes a palavra capícua. Ó valha-me Nossa Senhora das Coisas Impossíveis.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Outono


"Uma forma de me despedir" é o nome do poema. O autor é Ruy Belo. Dito na sessão de outubro,(o tema foi Outono) das Quartas Mal Ditas, no Clube Literário do Porto.

Desabafos

Somos um país de coscuvilheiros, maldizentes e invejosos. Defeitos que já veem de muito longe, e que agora cada vez  se refinam com o desgoverno mais ao jeito de "quanto mais se baixam mais se lhe vê o cu", deste governo de mentirosos "troikados". Como podemos viver aqui? 

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Serviço completo

Vai para quatro anos, fui com gente amiga dar uma volta por terras de Miguel Torga. Depois da visita à casa do poeta, e de uma longa conversa com o padre companheiro de caçadas de Torga, partimos do pequeno largo do centro da vila, para uma visita à capela da Senhora da Azinheira, capela em estilo barroco, datada do séc. XVII.No início da rua de saída do largo, a nossa guia recomendou-nos que uns metros à frente olhássemos com curiosidade para o lado esquerdo da rua. A curiosidade estava num grande letreiro junto a um prédio, que anunciava a actividade comercial a que se dedicavam os proprietários. Alguns de nós não pudemos conter o riso (outros um sorriso). O letreiro dizia: pronto a vestir/florista/agência funerária. Serviço completo portanto.
Tempos depois, numa visita a Tarouca,  deparámos com uma situação que nos fez lembrar aquela outra, e que podem constatar na fotografia acima. Aqui, ao defunto oferecia-se transporte e acompanhamento musical, Nada mau. Pelos vistos por aquelas bandas, o defunto não precisa de se deslocar a muitos sítios para tratar do funeral. Ali usa-se o três em um, que a interioridade pesa.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Para ti, Carlos


Para ti, Carlos, eu sei que gostarias.

Púcaros de poesia


Faz agora um ano que o Carlos Pinto, alma do Pucaros, e impulsionador das noites de poesia durante quase 14 anos, e de outras, nos pregou a partida de se ausentar para "parte certa". Ficou a mágoa nos que frequentávamos as noites de poesia, de suportar a sua ausência, e a nostalgia de algumas noites memoráveis. Para minorar a saudade que sentimos do Carlos e do Pucaros (que nunca mais foi o mesmo), fica este vídeo, um excerto de uma reportagem da TVI, sobre as noites de poesia do Pucaros. Foi no São Martinho de há dois anos. Eu sou aquele que diz algumas quadras brejeiras, acerca da quadra festiva. Se é que a memória no-lo consente), aquele abraço, rapaz.

domingo, 30 de outubro de 2011

Foi bonita a festa, pá

Na passada sexta-feira estive em Ermesinde em mais um jantar poético-musical e já agora, também gastronómico, como sempre organizado pelo amigo Valdrez. Desta vez com um acrescido motivo de interesse, a presença do jornalista, cronista, poeta e dramaturgo Manuel António Pina, o galardoado de 2011 com o Prémio Camões, como sabem (e senão sabem deviam saber)o maior prémio literário português. Estiveram também a dizer poesia do MAP, como tão bem sabem, a Lurdes dos Anjos, a Fernanda Cardoso e o Aurelino Costa, com a parte musical entregue a Manuel Valdrez e a Rocha Ferreira que como sempre interpretaram com mestria composições de Carlos Paredes. O MAP seguiu com alguma emoção, como se lhe viu, e como confessou, a leitura da sua poesia. No final, quando agradeceu a singela homenagem que lhe prestámos, disse sensibilizado, que não sabia que escrevia tão bem poesia, se não a tivesse ouvido dita por quem sabe. Por mim, e pelos meus companheiros(as), obrigado M.A.Pina. E foi bonita a festa pá

*Obrigado ao Chico Buarque, pelo título

Preguiça

Ora pois, cá estou de novo, depois de um curto período de estágio no sítio da preguiça. E cá estou "por motivos" como diz o outro. E são dois, o primeiro porque a filhota me puxou as orelhas pela ausência. E como não quero desiludi-la, já que segundo sei andou espalhar com engenho e arte" pelas suas amizades, a existência deste blog, cá estou. Mas o motivo principal que me levou a regressar precisamente hoje, é que a filhota cumpre mais um aniversário. Espero que cumpra muitos, porque merece. E que hoje, para ti, filhota, tenha sido um dia mais ou menos dedicado à preguiça.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Saudade


Perguntarão: mas que faz aqui este vídeo, o filme deve ser muito antigo! E alguma razão vos assiste.Antes da explicação, diremos que o filme se chama Violetas Imperiais e que já tem um pouco mais de 60 anos. Os actores principais eram o tenor Luis Mariano e a actriz Carmen Sevilla, a mesma que aparece no vídeo, no início, cantarolando. A razão de o colocar aqui é um pouco o matar saudades, porque tanto quanto a minha memória consegue recuar, este foi o primeiro filme que vi, tinha eu oito anos, lá na velha sala de cinema - sala que já não existe - da minha freguesia. O filme era para 12 anos, mas como nessa altura eu já era grandinho, meio escondido pelas saias da mãe, lá tive permissão para entrar. Talvez venha daí o meu gosto por musicais, pela cena, pelo teatro.

domingo, 16 de outubro de 2011

Primavera no outono


De vez em quando dá um gozo do caraças cair na tentação de "roubar" a alguém uma qualquer coisa de que gostámos. Foi o que aconteceu com este vídeo que surripiei no Cantigueiro. As moçoilas são israelitas, dão pelo nome de Carmel, cantam, e bem, a capella. Como já repararam cantam a "Primavera" das Quatro Estações de Vivaldi. Deliciem-se quanto eu me deliciei e... bom domingo.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Carta a meus filhos sobre os fusilamentos de Goya


Quarta-feira,
5 de Outubro, 21.30 h,
QUARTAS MAL DITAS
no Piano-bar do
Clube Literário do Porto.

Tema: POESIA & PINTURA.

Leituras por Amílcar Mendes, Ana Almeida Santos, Anthero Monteiro, António Pinheiro, Cláudia Pinho, Luís Carvalho e Rafael Tormenta.

Convidado especial: Fernando Gaspar.

Intervenções musicais de Rui Paulino David.
Colaboração de Fátima Lopes.

Num dos textos antecedentes prometi que colocaria aqui o poema de Jorge de Sena, Carta a meus filhos sobre os fusilamentos de Goya. O momento chegou. Hoje vou participar nas Quartas Mal Ditas, cujo tema é Poesia & Pintura. Curiosamente, e sem saber que tal ia
acontecer, um dos poemas que me calha em sorte é precisamente o poema de Jorge de Sena. Vou tentar defendê-lo o melhor que me for possível.

Carta a meus filhos sobre os fusilamentos de  Goya

Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso.
É possível, porque tudo é possível, que ele seja
aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo,
onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém
de nada haver que não seja simples e natural.
Um mundo em que tudo seja permitido,
conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer,
o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós.
E é possível que não seja isto, nem seja sequer isto
o que vos interesse para viver. Tudo é possível,
ainda quando lutemos, como devemos lutar,
por quanto nos pareça a liberdade e a justiça,
ou mais que qualquer delas uma fiel
dedicação à honra de estar vivo.
Um dia sabereis que mais que a humanidade
não tem conta o número dos que pensaram assim,
amaram o seu semelhante no que ele tinha de único,
de insólito, de livre, de diferente,
e foram sacrificados, torturados, espancados,
e entregues hipocritamente â secular justiça,
para que os liquidasse «com suma piedade e sem efusão de sangue.»
Por serem fiéis a um deus, a um pensamento,
a uma pátria, uma esperança, ou muito apenas
à fome irrespondível que lhes roía as entranhas,
foram estripados, esfolados, queimados, gaseados,
e os seus corpos amontoados tão anonimamente quanto haviam vivido,
ou suas cinzas dispersas para que delas não restasse memória.
Às vezes, por serem de uma raça, outras
por serem de uma classe, expiaram todos
os erros que não tinham cometido ou não tinham consciência
de haver cometido. Mas também aconteceu
e acontece que não foram mortos.
Houve sempre infinitas maneiras de prevalecer,
aniquilando mansamente, delicadamente,
por ínvios caminhos quais se diz que são ínvios os de Deus.
Estes fuzilamentos, este heroísmo, este horror,
foi uma coisa, entre mil, acontecida em Espanha
há mais de um século e que por violenta e injusta
ofendeu o coração de um pintor chamado Goya,
que tinha um coração muito grande, cheio de fúria
e de amor. Mas isto nada é, meus filhos.
Apenas um episódio, um episódio breve,
nesta cadeia de que sois um elo (ou não sereis)
de ferro e de suor e sangue e algum sémen
a caminho do mundo que vos sonho.
Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém
vale mais que uma vida ou a alegria de tê-la.
É isto o que mais importa - essa alegria.
Acreditai que a dignidade em que hão-de falar-vos tanto
não é senão essa alegria que vem
de estar-se vivo e sabendo que nenhuma vez alguém
está menos vivo ou sofre ou morre
para que um só de vós resista um pouco mais
à morte que é de todos e virá.
Que tudo isto sabereis serenamente,
sem culpas a ninguém, sem terror, sem ambição,
e sobretudo sem desapego ou indiferença,
ardentemente espero. Tanto sangue,
tanta dor, tanta angústia, um dia
- mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga -
não hão-de ser em vão. Confesso que
multas vezes, pensando no horror de tantos séculos
de opressão e crueldade, hesito por momentos
e uma amargura me submerge inconsolável.
Serão ou não em vão? Mas, mesmo que o não sejam,
quem ressuscita esses milhões, quem restitui
não só a vida, mas tudo o que lhes foi tirado?
Nenhum Juízo Final, meus filhos, pode dar-lhes
aquele instante que não viveram, aquele objecto
que não fruíram, aquele gesto
de amor, que fariam «amanhã».
E, por isso, o mesmo mundo que criemos
nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa
que não é nossa, que nos é cedida
para a guardarmos respeitosamente
em memória do sangue que nos corre nas veias,
da nossa carne que foi outra, do amor que
outros não amaram porque lho roubaram.

sábado, 24 de setembro de 2011

O céu dos gatos

(--)
sei muito bem que andas
por aqui
(--)
não sei mesmo se há um céu dos gatos
mas mesmo que haja tu vais
arranjar maneira
de estar por aqui

como ainda hoje o fizeste.

O meu colega e amigo Nelson Ferraz, bom poeta e homem sensível (como são os bons poetas),teve até há pouco (fisicamente) lá em casa a sua gata Kelly. O destino fez com que ela partisse. O Nelson escreveu no seu blog um poema à Kelly e pediu-me que eu deixasse um comentário. Cumpridor, escrevi-o e tentei colocá-lo no blog. Só que por não saber, ou por qualquer outra circuntância, não consegui.
Aqui fica o comentário:
"De certeza certa, não sei se há um céu dos gatos, mas creio que sim. Mas sei que os gatos quando partem, voam toda a noite em direcção à lua onde os espera um velho gato já cego que os envia para o espaço transformados em poeira das estrelas, que em noites enluaradas vemos cair em pó prateado, na direcção da Terra."

O itálico do comentário pertence a um texto de Mário Cesariny.

Independentizêmo-los

Independência para a Madeira, já. Basta de chulice. Que o meu pouco dinheiro fique no continente e não sirva para alimentar sanguessugas. E já agora um desejo:ó ti jonas, se os buracos existentes não são suficientes, crie lá mais um ou dois e afunde-se com a ilha. Dixit.

sábado, 17 de setembro de 2011

Porque hoje é sábado

Hoje resolvi revisitar o excelente poema de Vinicius de Moraes, O Dia da Criação, poema dividido em três partes, do qual a mais conhecida é a segunda. Muitos se lembrarão que nos anos 80 do século passado esta parte do poema foi repetida até à exaustão. É um poema extenso, que todo ele daria um bom espectáculo. Então aqui fica a parte dois do poema, porque hoje é sábado...
II


NESTE MOMENTO há um casamento
Porque hoje é sábado.
Há um divórcio e um violamento
Porque hoje é sábado.
Há um homem rico que se mata
Porque hoje é sábado.
Há um incesto e uma regata
Porque hoje é sábado.
Há um  espectáculo de gala
Porque hoje é sábado.
Há uma mulher que apanha e cala
Porque hoje é sábado.
Há um renovar-se de esperanças
Porque hoje é sábado.
Há uma profunda discordância
Porque hoje é sábado.
Há um sedutor que tomba morto
Porque hoje é sábado.
Há um grande espírito de porco
Porque hoje é sábado.
Há uma mulher que vira homem
Porque hoje é sábado.
Há criancinhas que não comem
Porque hoje é sábado.
Há um piquenique de políticos
Porque hoje é sábado.
Há um grande acréscimo de sífilis
Porque hoje é sábado.
Há um ariano e uma mulata
Porque hoje é sábado.
Há uma tensão inusitada
Porque hoje é sábado.
Há adolescências seminuas
Porque hoje é sábado.
Há um vampiro pelas ruas
Porque hoje é sábado.
Há um grande aumento no consumo
Porque hoje é sábado.
Há um noivo pouco de ciúmes
Porque hoje é sábado.
Há um garden-party na cadeia
Porque hoje é sábado.
Há uma impassível lua cheia
Porque hoje é sábado.
Há damas de todas as classes
Porque hoje é sábado.
Umas difíceis, outras fáceis
Porque hoje é sábado.
Há um beber e um dar sem conta
Porque hoje é sábado.
Há uma infeliz que vai de tonta
Porque hoje é sábado.
Há um padre passeando à paisana
Porque hoje é sábado.
Há um frenesi de dar bananas
Porque hoje é sábado.
Há uma sensação angustiante
Porque hoje é sábado.
De uma mulher dentro de um homem
Porque hoje é sábado.
Há uma comemoração fantástica
Porque hoje é sábado.
Da primeira cirurgia plástica
Porque hoje é sábado.
E dando os trâmites por findos
Porque hoje é sábado.
Há a espectativa de domingo
Porque hoje é sábado.

Carantonhas, tenham (dentro do que vos for possível) um bom domingo



terça-feira, 13 de setembro de 2011

A pinoquiar

Porque estamos num país com um goberno de "pinóquios", ocorreu-me perguntar:
- Quando é que o ministro das finanças muda as pilhas? Num texto de duas palavras ouvimos uma num dia e outra no outro.
- E o Álvaro, quando nos "dará" mais "pérolas"? Não pudemos chutá-lo já para o Canadá?
- E a cristas, anda a agriculturar o quê?
- Alguém viu por aí a paulinha da justiça? Será que anda a trabalhar?
- E não é que o "matemático" ministro da educação já sabe conjugar mais um verbo? "Eu capitulo..." Os professores, embora maciamente, vão contestando, mas agrdecem.
- E digam lá, já viram por aí o secretário de estado da cultura?
- E o macedo da saúde a tirar do chapéu todos os dias novas medidas para nos "tratar"?

domingo, 11 de setembro de 2011

Mundo deplorável e desprezível

Na era moderna houve, sem dúvida, dois acontecimentos que mudaram o mundo. Refiro-me ao aparecimento da televisão, a "caixa que mudou o mundo", e ao 11 de Setembro de 2001, o mais recente, um crime hediondo, inqualificável. Passam hoje dez anos sobre o infausto acontecimento e parece-nos que foi ontem. Ainda está bem vivo na nossa memória. Durante quantos anos mais? Questiono-me, porque temos memória curta, pois já nos esquecemos (e aqui refiro-me concretamente à "caixa que mudou o mundo" e aos restantes media) que existiu também o 11 de setembro de 1973, no Chile, um  golpe fascista que, com a colaboração dos EE.UU .derrubou o presidente comunista Salvador Allende. E sucederam-se perseguições e milhares de assassinatos (nestes,incluídos inúmeros fuzilamentos). Seria bom que não o esquecessemos.
Por associação de ideias lembrei-me dos Fuzilamentos de 3 de maio, do pintor espanhol Francisco de Goya e do fantástico poema de Jorge de Sena, a propósito deste quadro - Carta a meus filhos sobre os fuzilamentos de Goya.
Como é um poema extenso fica para ilustrar um outro texto.
Hoje deixo aqui um pequeno poema de Carlos Pinhão, mais conhecido como jornalista desportivo.

A GUERRA

Num ano qualquer
houve uma batalha qualquer
numa terra qualquer
entre um rei qualquer e outro rei qualquer.
No fim, um anjo qualquer
desceu no campo de batalha,
pegou nos cadaveres do rei qualquer e do rei qualquer
e disse para um deus qualquer:
- Qual quer?

Fiquem bem, e tenham uma boa semana de trabalho.


segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Freddie Mercury


Quando nasceu na colónia britânica de Zanzibar, filho de pais indianos, deram-lhe o nome de Farrokh Bulsara. Mas foi como Fredie Mercury, vocalista do grupo Queen, que se tornou conhecido e apontado com um dos melhores cantores de todos os tempos e uma das vozes mais conhecidas do mundo. Como se comprova neste video, era um autêntico animal de palco. Quem não conhece  Bohemian Rhapsody, uma das suas primeiras composições, ou We are the Champions ou Barcelona?
Como escreveu há alguns séculos um poeta romano, "morrem cedo os que os deuses amam". Se fosse vivo faria hoje 65 anos.
Aqui fica um texto que ele escreveu pouco antes de morrer:  

UM AMOR LOUCO

Quando a conheci, eu tinha 16 anos.
Fomos apresentados numa festa, por um “gajo” que se dizia meu amigo.
Foi amor à primeira vista. Ela enlouquecia-me. O nosso amor chegou a um ponto em que já não conseguia viver sem ela. Mas era um amor proibido. Os meus pais não a aceitavam. Fui repreendido na escola e passámos a encontrar-nos às escondidas.
Mas não aguentava mais, estava louco. Eu queria-a mas não a tinha. Eu não podia permitir que me separassem dela. Eu amava-a: bati com o carro, parti quase tudo que tinha em casa e quase matei a minha irmã. Estava louco, precisava dela.
Hoje tenho 39 anos, estou internado num hospital, sou inútil, e vou morrer abandonado pelos meus pais, pelos amigos e por ela.
A ela devo o meu amor, a minha vida, minha destruição e minha morte.
O nome dela? COCAÍNA.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Descanso

                         Descanso do gato preto depois da leitura.

Este é o Cocas, o gato do vizinho. Passa mais tempo a dormir, e come mais cá em casa, do que na casa onde pertence. É um sacaninha. De vez em quando desafia (ou desafiam-se) o Nico, o gato cá de casa, e dão uma saltada até ao "Tinoco, o clube da gataria da cidade"*. Vida(s) de gato...

* MIguel Torga, in Mago, do livro Bichos.


quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Título? Que título?

 Até que enfim, desagrafado. E desagravado (sim, sim, no sentido de desinflamado, aliviado). Agora, já me sinto e já me sento melhor. Já não era sem tempo. E sentado, agora só falta arranjar um título pra isto.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Reflexão

Dei por mim a reflectir:
- Qual será a nesga do irracional (já que racional não pode ser) onde podemos encaixar o que nos acontece quando sofremos de alguma maleita ou recuperamos de uma cirurgia, por exemplo, que nos "proíbe" (porque não podemos ou não devemos) de nos baixarmos, e tudo aquilo em que pegamos, ou queremos pegar, nos cai ao chão? Se alguém souber... Eu estou farto. Irra.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Música com alegria


Começar a semana com música foi o que hoje me apeteceu. Ainda mais com um grupo vocal que respira alegria e boa disposição quando canta. Espero que se divirtam como eu me diverti. Ah, já agora boa semana de trabalho ou de férias.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Polícias e ladrões

Quando ontem li no JN a notícia “gangues negoceiam metralhadoras no Porto”, lembrei-me de um episódio que também mete polícias e ladrões, o qual me provocou algum riso tempos depois. Numa das praças do Porto, outrora com nome de pintor célebre descendente de portugueses, e agora com nome de político, existe um café onde param as mais variadas gentes, nas quais se incluem as duas categorias acima referidas. Normalmente sou um sofrível frequentador de cafés, e a esse, por norma só vou quando, por conveniência, tenha que me encontrar com pessoa amiga. Numa dessas ocasiões reparei que muita gente fixou em mim o olhar, quando franqueei a porta de entrada. Porque nas outras vezes nunca havia reparado, estranhei o facto. Dias depois, ao comentar “a coisa” com um amigo jornalista, este riu-se e então lá veio a explicação. «Simples, meu amigo. Quando entraste, de um lado a expectativa. Olá, temos ladrão novo! Do outro lado a interrogação. Quem será este polícia? Explicação dada, veio a gargalhada. Fim.

"Bonecos de fogo preso"

O meu amigo Seixas Branco partiu. Poeta, pintor, o Castelinho, como também era afectuosamente tratado (Seixas Castelo Branco) deixou-nos, entre outros mais recentes, nos quais experimentou uma renovada linguagem poética, um livro admirável - "Bonecos de fogo preso" - escrito há mais de 50 anos, e que infelizmente nunca foi reeditado. Nele plasmou com inusitada mestria, as gentes da ribeira do Porto (ele, que era transmontano), o São João das Fontaínhas, o quotidiano dos bairros ribeirinhos. Poemas, que juntos, eram um só e fantástico poema, de uma teatralidade espantosa, (ele também pisou esses terrenos). Talvez que agora, lá, onde estará a chegar, encontre alguém que dê ao "Bonecos de fogo preso" o palco que merece. Amigo, até sempre.

domingo, 17 de julho de 2011

Luzes

É claro que não gosto também do actual governo. Apesar de ser um governo de paus-mandados, uma coisa me preocupa. É que não vi ainda que esteja a crescer o nariz ao mentiroso chefe-pinóquio. A quadrilha (refiro-me à dança, é óbvio) vai funcionando, embora os passos não estejam, por enquanto (alguma vez estarão?), ao ritmo que o país deseja.
Devo, no entanto, confessar que estou absolutamente de acordo com uma das medidas já tomadas pela ministra da agricultura e outras actividades mais, qual seja a de reduzir o ar condicionado, no sentido de reduzir o consumo energético, melhorar o ambiente e poupar uns cobres ao Estado. Para isso nada melhor do que começar por despir os homens, ordenando-lhes que deixem as gravatas em casa. Espero que a seguir seja o casaco e se fiquem por aí. “Sans blague”. É que a gravata faz-me lembrar a luta que encetei nos idos de 1971, e para a qual incentivei os colegas, na empresa em que trabalhei, um grande grupo financeiro, para que trabalhássemos sem gravata e sem casaco, manobrando grandes e antigas máquinas de contabilidade, as avós (algumas já bisavós) dos actuais computadores. Ganhámos a luta e passámos a produzir mais e melhor.
Por isso aplaudo a medida da ministra. É que mesmo com janelas nos edifícios do ministério, sem ar, ou com menos ar condicionado, ainda que seja por sugestão, entra mais luz nos serviços e porventura nas janelas da alma dos funcionários. E, quiçá, nas da própria ministra.
E porque no parágrafo anterior falei em janelas, termino com um texto do meu amigo e colega Nelson Ferraz

 uma luz

A percentagem de pessoas que costuma tirar partido das janelas e varandas de suas casas é uma coisa tão minúscula, que chega a parecer perfeitamente escusada, essa tradição humanóide de fazer aberturas envidraçadas nas paredes dos edifícios.
Algumas dessas peças das casas irão desaparecer, sem nunca terem tido um hóspede ou um abano de cortina.
… o segmento de rua onde resido, deve ter, pelo menos, umas cinquenta coisas dessas (entre varandas, janelas e janelinhas do tipo respirador).
São 22,45h, reina a noite e o silêncio das persianas.
Apenas uma janelinha estreitinha, com luz. (???)
É evidente que, lá ao fundo, no outro lado da rua, alguém se recusa
a cagar às escuras.


sexta-feira, 15 de julho de 2011

Gatos especiais


"O gato é o único grande sedutor que sabe onde e quando deve parar, para não passar de sedutor a seduzido"
(Anónimo)

"Prefiro os gatos aos cães, pois não há gatos polícias."
Jean Cocteau 

Gosto de gatos. Também gosto de outros animais domésticos. Mas gosto particularmente de gatos. Gosto da  forma como brincam, como mostram quando estão zangados, de como não nos ligam nenhuma quando os chamamos, de como são independentes. Gosto de gatos. Tive a Baby (ou ela teve-me) durante 18 anos. Morreu depois do Nicola, gato vadio que eu acolhi e tratei quando uma “besta” o encontrou de cabeça metida num saco de restos, e o quis matar à paulada. Viveu lá em casa cinco anos. Partiu levado por uma doença congénita. E aqui me confesso: nunca chorei tanto por ninguém, como chorei pelo Nicola. Agora tenho o Nico, duas cores, preto e branco, o dono da casa, o nosso “menino”. Portanto, gosto de gatos. Ponto.
O meu amigo e colega N.F., também gosta de gatos. Como ele, por feitio, não gosta muito de se expor (por isso o identifico pelas iniciais do nome), terei que cometer uma pequena e inofensiva “traição” (outros dirão, uma inconfidência) pois vou falar da sua gata, que lá em casa todos tratam como se fosse uma pessoa da família. Infelizmente por doença, a gata foi submetida a uma cirurgia e ficou paralisada das patas traseiras, o que origina enormes dificuldades à sua locomoção.
Então, exteriorizando o carinho a afeição e o amor que lá em casa todos tem pela gata, o meu amigo, como bom poeta que é escreveu em sua homenagem o poema que fecha este texto.

KELLY
(uma gata especial, quase pessoa)

ainda tens pássaros nos olhos
mesmo que de fugida
agora.
e os degraus da escada castanha
também os tens nos olhos
mesmo que num esboço
agora.
e esse azul esse belíssimo azul
que eram lagos nos teus olhos
ainda o tens
mesmo que um azul baço
agora.
ainda tens nos teus olhos
o jogo das escondidas que repetias
no mesmo sítio de sempre
mesmo que já não jogues
agora.
agora ainda tens nos olhos
a mesma nesga delicada de ternura
felina e doce e brava
e
com uma dignidade enorme e cheia de silêncios
arranhas a vida numa serena decadência
que os biscoitos não escondem.
agora
lá no fundo desses teus olhos incrivelmente belos
há uma paisagem desconhecida
que de uma forma rebelde e injusta
desenha colos intranquilos
nos teus ronrons.

Nelson Ferraz in “Gondomar Económico”, Julho de 2011