quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Quartas Mal-Ditas 2011



Aí está a primeira sessão das Quartas Mal - Ditas no novo ano:
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"habitualmente prefiro as curvas"
-5 de Janeiro no Piano Bar do Clube Literário do Porto - Rua Nova da Alfândega - 22 horas
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-Convidado especial:
JOÃO HABITUALMENTE
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Leituras por: Amílcar Mendes/Ana Almeida Santos/Anthero Monteiro/António Pinheiro/Cláudia Pinho/Diana Devezas/Luís Beirão/Mário Vale Lima/Rafael Tormenta
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Música por:
Rui Paulino David
 
Apareçam - Divulguem
 

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema XVIII

O poema para a noite de Natal é de David Mourão-Ferreira. Bom será que possamos dar graças quando Ele nos chamar a prestar contas. 
Caros Carantonhas, que a Luz vos ilumine, e a poeira das estrelas lance sobre todos vós as maiores venturas.

LITANIA PARA O NATAL DE 1967

Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
num sótão num porão numa cave inundada
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
dentro de um foguetão reduzido a sucata
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
numa casa de Hanói ontem bombardeada

Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
num presépio de lama e de sangue e de cisco
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
para ter amanhã a suspeita que existe
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
tem no ano dois mil a idade de Cristo

Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
vê-lo-emos depois de chicote no templo
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
e anda já um terror no látego do vento
Vai nascer esta noite à meia-noite em ponto
Para nos vir pedir contas do nosso tempo

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Poemas com Natal por tema XVI e XVII

Hoje há poemas e não poema. É uma tentativa de recuperar os poemas que faltaram, por um ou outro motivo, em alguns dias. Diga-se que faltaram aqui poemas com outras visões do Natal. Não foi intencional, pois a escolha foi aleatória. Vamos então aos poemas. O primeiro tem como autor o poieta e dramaturgo Francisco Ventura

AMANHÃ É NATAL

A neve ouviu aos ventos: «É Natal!»
E revestiu planícies e montanhas
De brancura ideal.

As árvores sentiram: «É Natal!»
E balançaram ramos resplendentes
Num bailado irreal.

As árvores escutaram: «É Natal!»
E envolveram os campos e as almas
Num canto sem igual.

Os astros escreveram: «É Natal!»
E inundaram a terra sua irmã
Duma luz celestial.

Os anjos repetiram: «É Natal!»
E trombetas e vozes se expandiram
Num coro divinal.

Os homens exultaram: «É Natal»
E comeram, comeram, comeram
Até fazer mal.

O segundo poema é de Miguel Torga

HISTÓRIA ANTIGA               

Era uma vez, lá na Judeia, um rei.
Feio bicho, de resto:
Uma cara de burro sem cabresto
 E duas grandes tranças.
A gente olhava, reparava e via
Que naquela figura não havia
Olhos de quem gosta de crianças.

E, na verdade, assim acontecia,
Porque um dia,
O malvado,
Só por ter o poder de quem é rei
Ou não ter coração,
Sem mais nem menos,
Mandou matar quantos eram pequenos
Nas cidades e aldeias da Nação.

Mas,
Por acaso ou milagre, aconteceu
Que, num burrinho pela areia fora,
Fugiu
Daquelas mãos de sangue um pequenito
Que o vivo sol da vida acarinhou;
E bastou
Esse palmo de sonho
Para encher este mundo de alegria;
Para crescer, ser Deus;
E meter no inferno o tal das tranças,
Só porque ele não gostava de crianças.

Protesto impressionante

Impressionantes as imagens de um cidadão romeno, atirando-se de uma altura de sete metros, das galerias do parlamento do seu país. A sua atitude consubstanciava um protesto desesperado contra os cortes de salários aos funcionários públicos, e subsídios aos deficientes.Seria bom que os nossos políticos, depois de verem isto (porque de certeza viram ou vão ver) meditassem nas consequências de algumas medidas que tomam. E que tomem consciência de que algumas medidas que congeminam e aprovam podem arruinar a vida dos abrangidos. E já tomaram medidas semelhantes. E por aqui me fico.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema XV

O poema de hoje é da autoria do poeta Álvaro Feijó.

NATAL

Nasceu.
Foi numa cama de folhelho
entre lençóis de estopa suja
num pardieiro velho.
Trinta horas depois a mãe pegou na enxada
e foi roçar nas bordas dos caminhos
manadas de ervas
para a ovelha triste.
E a criança ficou no pardieiro
só com o fumo negro das paredes
e o crepitar do fogo,
enroscado num cesto vindimeiro,
que não havia berço
naquela casa.

E ninguém conta a história do menino
que não teve
nem magos a adorá-lo,
nem vacas a aquecê-lo,
mas que há-de ter
muitos Reis da Judeia a persegui-lo;
que não terá coroa de espinhos
mas coroa de baionetas
postas até ao fundo do seu corpo.
Ninguém há-de contar a história do menino.
Ninguém lhe vai chamar o Salvador do Mundo.

FELIZ NATAL



Eu, e o Nico desejamos a todos os estimados Carantonhas, que nos seguem habitualmente, mas também aos que ocasionalmente passam por aqui,

UM NATAL FELIZ
e
que em 2011 os vossos sonhos se realizem

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Se

Há dias escrevi aqui sobre Kipling e o seu poema Se e prometi voltar a ele e a uma ou outra curiosidade, sobre o mesmo. Há várias traduções para o português. A mais conhecida é a de Félix Bermudes, poeta, filósofo e autor teatral, e foi divulgada por João Villaret. Da tradução de F. Bermudes  resulta um belíssimo poema, arriscaria a dizer, melhor que o original, uma vez que no fundo é uma reescrita. Isto, porque, e aqui vai a primeira curiosidade, o original tem trinta e dois versos e a tradução de F. Bermudes tem quarenta e oito. Uma segunda curiosidade aparece na tradução do poeta António Ramos Rosa. Nesta, o poema tem trinta e um versos, em vez dos trinta e dois originais. E agora o poema, que o poeta escreveu com conselhos para o seu filho.

Se

Se podes conservar o teu bom senso e a calma
No mundo a delirar para quem o louco és tu…
Se podes crer em ti com toda a força de alma
Quando ninguém te crê…Se vais faminto e nu,

Trilhando sem revolta um rumo solitário…
Se à torva intolerância, à negra incompreensão,
Tu podes responder subindo o teu calvário
Com lágrimas de
amor e bênçãos de perdão…
Se podes dizer bem de quem te calunia…
Se dás ternura em troca aos que te dão rancor
(Mas sem a afectação de um santo que oficia
Nem pretensões de sábio a dar lições de amor)…

Se podes esperar sem fatigar a esperança…
Sonhar, mas conservar-te acima do teu sonho…
Fazer do pensamento um arco de aliança,
Entre o clarão do inferno e a luz do céu risonho…

Se podes encarar com indiferença igual
O triunfo e a derrota, eternos impostores…
Se podes ver o bem oculto em todo o mal
E resignar sorrindo o amor dos teus amores…

Se podes resistir à raiva e à vergonha
De ver envenenar as frases que disseste
E que um velhaco emprega eivadas de peçonha
Com falsas intenções que tu jamais lhes deste…

Se podes ver por terra as obras que fizeste,
Vaiadas por malsins, desorientando o povo,
E sem dizeres palavra, e sem um termo agreste,
Voltares ao princípio a construir de novo…

Se puderes obrigar o coração e os músculos
A renovar um esforço há muito vacilante,
Quando no teu corpo, já afogado em crepúsculos,
Só exista a vontade a comandar avante…

Se vivendo entre o povo és virtuoso e nobre…
Se vivendo entre os reis, conservas a
humildade
Se inimigo ou
amigo, o poderoso e o pobre
São iguais para ti à luz da eternidade…

Se quem conta contigo encontra mais que a conta…
Se podes empregar os sessenta segundos
Do minuto que passa em obra de tal monta
Que o minuto se espraie em séculos fecundos…

Então, ó ser sublime, o mundo inteiro é teu!
Já dominaste os reis, os tempos, os espaços!…
Mas, ainda para além, um novo sol rompeu,
Abrindo o infinito ao rumo dos teus passos.

Pairando numa esfera acima deste plano,
Sem receares jamais que os
erros te retomem,
Quando já nada houver em ti que seja humano,
Alegra-te, meu filho, - então serás um homem!…


segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema XIV

Trago-vos hoje um poema de um poeta portuense (1866-1948), João Saraiva.

DO NATAL Á CRUZ

Numas palhinhas deitado,
Abrindo os olhos à luz,
´Loiro, gordinho, rosado,
Nasce o Menino Jesus.

Uma vaquinha bafeja
Seu lindo corpo divino,
De mansinho, que a mão veja
E não se assuste o Menino!

Meia-noite. Canta o galo.
Por essa Judeia além
Dormem os que hão-de matá-lo
Quando for homem também...

E, pensativa, a Mãe Pura
Ouve, fitando Jesus,
Os rouxinóis na espessura
Dum cedro que há-de ser cruz!...

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema XIII

 Pedro Homem de Mello, mais uma vez presente.

NATAL

Menino dormindo...
Silêncio profundo.
Benvindo, benvindo,
Salvador do Mundo!

Noite. Noite Fria.
Mas que linda que é!
De um lado Maria.
Do outro José.

Um anjo descerra
A ponta do véu...
E cai sobre a Terra
A imagem do Céu!

Nota à margem: Os puristas dirão que benvindo é erro, que é bem vindo. Mas até mesmo os puristas sabem que aos poetas todas as liberdades (poéticas) são permitidas.

Frio? Normal

Porque o dia esteve frio, porque a noite está fria (no momento em que escrevo o termómetro marca 4 graus), porque o texto anterior é um pouco azedo, apetece-me (vá-se lá saber porquê) trazer aqui um poema do meu amigo Nelson Ferraz.

NORMAL

O sol hoje vestiu um casaco porque tinha frio.
A lua, de carapins, deitou-se numa nuvem de flanela
As àrvores, hoje, tinham livros em vez de folhas
E o mar fazia ondas de areia que se quedavam na terra da praia.

As aves nadavam em rodopio.
As flores cresciam no betão.

Tudo normal. Tudo absolutamente normal.

Até mesmo...aquele senhor importante
Que para parecer bem
Colocou na alma um código de barras.

Os candidatos

Eles aí estão prontos a bailar a dois. E a dar-nos baile. Vão falar, falar, bla, bla, bla, e não vão dizer nada. Vão desvendar-nos o que eles chamam os podres de cada um. Vão chamar-se mutuamente de mentirosos.Com uma pequena nuance a armar ao elegante: nenhum diz mentiras, diz inverdades. Uns puxam da cartilha, e insistem nela sem se desviar uma linha daquilo que de tanto ser repetido já sai de cor. Outros vão usar da sua experiência de calcorreadores ou passeantes (da, ou pela) política. Todos vão prometer resolver os problemas dos portugueses, sabendo que pela inerência do cargo isso lhes está practicamente vedado.Mas mesmo assim dizem-nos que vão usar a sua (deles) influência. Ah, e vão falar-nos muito dos trabalhadores. Vão encher a boca com os trabalhadores. Vão resolver os problemas dos trabalhadores. E isto dos trabalhadores, e aquilo dos trabalhadores, e os trabalhadores, mais os trabalhadores. E os desempregados? E os reformados, e os jovens à procura do primeiro emprego, e os que ainda estudam? Esses não são portugueses. Portugueses são os trabalhadores. São assim os candidatos.
Não sei porquê, mas quando estava a escrever isto veio-me à memória aquela históriazinha (recuso-me a escrever estória) da Ana Hatherly, que é assim:
"Era uma vez duas serpentes que não gostavam uma da outra. Um dia encontraram-se num caminho muito estreito, e como não gostavam uma da outra devoraram-se mutuamente. Quando cada uma devorou a outra não ficou nada. Esta história tradicional demonstra que se deve amar o próximo, ou então ter muito cuidado com o que se come".

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema XII

Hoje é a vez de um poema de António de Sousa Freitas

NATAL

Natal!
Há quase dois mil anos...
E só o sofrimento traz desígnios
talvez imerecidos.
Que o homem não dispõe dos desenganos
nem do sonho há tanto empobrecidos.

Mas é Natal!
Tenhamos para todos um olhar
e o coração aberto a qualquer voz.
E pensemos de quem por nós passar
que é homem como nós!

Conversa ao almoço

Ontem estive num almoço, já habitual, de gente reformada, que passou por um determinado departamento da empresa onde trabalhámos. Como de costume, a conversa passou pela actualidade e também por recordar coisas (algumas boas, outras menos) que por nós tinham passado. A conversa foi animada, tendo por acompanhamento uma parrilhada de peixe reforçada por um bom arroz de grelos e feijão vermelho. Uma das histórias que contei passou-se comigo e aconteceu naquela fase louca pós 25 de Abril (aí por 1976), num outro departamento onde tinha ido dar uma ajuda. Sem lugar fixo ali, instalei-me no gabinete do gerente. Em determinada altura de um qualquer dia, tocou o telefone, que eu atendi. Aconteceu o diálogo seguinte:
- Fulano? (o nome do gerente)
-Não.
(suspensão momentânea, do outro lado)
- De onde é que fala?
- Do Kremlin
(Nova suspensão)
- Quem é que fala?
- É o Krutchev
- Obrigado
E desligou.
Do outro lado estava um director, pessoa bem conhecida, hoje com negócios fora da empresa, e que foi presidente da direcção de um dos grandes do futebol nacional.
Quando chegou à fala com o gerente, disse-lhe: «você tem lá um funcionário com muita graça».
Isto demonstra que o director também tinha sentido de humor. E eu ainda hoje me rio quando a conto ou me lembro dela. O director, não sei se sim.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Rudyard Kipling

Há uns tempos, uma amiga, desafiou-me a dizer um poema célebre do poeta ingês Rudyard Kipling, o SE. Kipling escritor inglês, será (ou é) mais conhecido pelos seus clássicos da literatura para a infância, O LIvro da Selva, O Segundo Livro da Selva, a novela Kim, etc, do que pelos seus poemas. Quem não se lembra de ter visto no cinema, o excelente desenho animado da Disney, sobre o Livro da Selva? Os "cotas" como eu, lembram-se do poema dito por João Vilarett. Ora, o que me levou a escrever este texto, foi um facto curioso, daqueles que por vezes nos levam a dizer,"olha como são as coisas!". Em determinada altura da sua vida, mais precisamente em 1889, aquele que já era considerado um grande escritor de língua inglesa, candidatou-se ao jornal San Francisco Examiner. Na volta, recebeu como resposta a seguinte carta de rejeição:«Lamento, Sr. Kipling, mas o senhor não sabe usar a língua inglesa». E esta, hem? Eu diria mehor, valha-nos São Pancrácio. Num dos próximos dias vou trazer aqui o poema, até para vos falar sobre coisas curiosas que descobri nas traduções (há várias, umas melhores, outras piores) do mesmo.
E agora, despeço-me até mais logo, pois tenho que ir decorar o poema.   

Poema com Natal por tema XI

Hoje, o poema sobre o Natal é de um poeta bem conhecido - talvez mais conhecido pelas anedotas que parece que ele nunca contou - Bocage

Poema de Natal

Se considero o triste abatimento
Em que me faz jazer minha desgraça,
A desesperação me despedaça,
No mesmo instante, o frágil sofrimento.

Mas súbito me diz o pensamento,
Para aplacar-me a dor que me trespassa,
Que Este que trouxe ao mundo a Lei da Graça,
Teve num vil presepe o nascimento.

Vejo na palha o Redentor chorando,
Ao lado a Mãe, prostrados os pastores,
A milagrosa estrela os reis guiando.

Vejo-O morrer depois, ó pecadores,
Por nós, e fecho os olhos, adorando
Os castigos do Céu como favores.



domingo, 12 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema X

O poema de hoje, de João Patrício, versa um tema profundamente actual, que infelizmente o será ainda por muitos anos.

NATAL DOS HOMENS

Todos os anos, Jesus
Feito criança, menino,
Transforma a terra em flor.
E em poucos dias, no mundo,
Os homens vivem unidos,
Falando apenas de amor.

Mas, quando o Natal acaba
E os dias são como os outros
Nas cidades e na serra,
Durante o resto do ano
Os homens já desavindos,
Apenas falam da guerra.

E assim decorrem os anos
Nesta atroz contradição:
- Os homens, podendo amar-se
Morrem de armas na mão!...

Caros carantonhas, tenham uma boa semana.

Recordes

Mais dois recordes para o Livro de Recordes do Guiness, em Portugal, mais precisamente no Porto. Um ontem, outro hoje.Confesso que, para mim, essa coisa dos recordes não aquece nem arrefece. Apesar de admitir como legítimo que qualquer pessoa tem direito aos seus quinze minutos de fama, acho os recordes uma patetice. E Portugal (eu ia a escrever, nós portugueses), segundo consta, é o país que tem inscritos mais recordes no Livro. O recorde de ontem foi a execução da maior travessa de aletria (quase 400 quilos!).Apesar de, como disse, não ligar a essas coisas, devo declarar que, embora possa parecer contraditório, confesso que estou ao mesmo tempo contente e triste por ter sabido do feito. Contente, pelo fim social da iniciativa, porque a receita angariada se destinou a recolher fundos para a Liga Portuguesa Contra o Cancro. Triste, porque não tive conhecimento desta acção (ou não foi publicitada, ou foi pouco), o que me impediu de contribuir e de comer um dos doces de que mais gosto. E isso eu não perdoo aos organizadores. Espero ter conhecimento da próxima feitura de aletria, senão...
Ah, o outro recorde foi a superação do do ano passado, de pessoas vestidas de Pai Natal.

sábado, 11 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema IX

Miguel Torga, mais uma vez, está presente com outro Natal.

NATAL

Foi tudo tão pontual
Que fiquei maravilhado.
Caiu neve no telhado
E juntou-se o mesmo gado
No curral.

Nem as palhas da pobreza
Faltaram na manjedoira!
Palhas babadas da toira
Que ruminava a grandeza
Do milagre pressentido.
Os bichos e a natureza
No palco já conhecido.

Mas, afinal, o cenário
Não bastou.
Fiado no calendário,
O homem nem perguntou
Se Deus era necessário...
E Deus não representou.

Carantonhas, tenham um bom domingo.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema VIII

O poema de hoje não tem autor, tem autores. É um poema constituido por quadras populares.

QUADRAS POPULARES

Esta noite à meia noite
Ouvi cantar ao Divino
Eram os Anjos do Céu
A embalar o Menino.

No mseio da Virgem Mãe
Encarnou Divina Graça.
Entrou e saiu por ela
Como o sol pela vidraça.

O Menino que nasceu
Da Virgem Cheia de Graça
Entrou e saiu por Ela
Como o sol pela vidraça.

Eu hei-de dar ao Menino
Uma fita p'rò chapéu
Também ela me há-de dar
Um lugarzinho no céu.

Mais João Habitualmente

Ontem estive, como participante, na "Onda Poética", em Espinho, em que se disse poesia de Álvaro de Campos. Lá esteve também como assistente, o poeta João Habitualmente, que teve a amabilidade de me oferecer o seu último livro "De minha máquina com teu corpo". Não perco a oportunidade de aqui anunciar que a sua poesia vai ser o tema das próximas sessões da Onda Poética e das Quartas Mal Ditas, esta no Clube Literário do Porto. Na contra-capa do "De minha máquina com teu corpo" vem inserido um interessante e sugestivo texto do poeta, que não resisto a transcrever. Disfrutem:
"Escrevi noutro lugar que já estive em muitos lugares, mas o lugar mais bonito é a escrita. Digo agora que o lugar mais bonito da escrita é a literatura. E o lugar mais bonito da literatura o poema. Também o mais ligeiro e o mais insondável. Pode ainda subir acima dele, voando através da arte de o dizer. Mário Viegas a dizer Vinicius, João Villaret a dizer Régio, Joaquim Castro Caldas a dizer Pessoa. Ou Ary a dizer Ary, Natália a dizer Natália, Pimenta a dizer Pimenta. Num mundo em que as palavras estão ao preço de um detergente barato, a poesia é também a arte de dizer muito escrevendo pouco. Pode ela ser exemplar para a inflação verbal que acomete hoje o planeta em chamas?"

E, João, aqui fica em letra de forma, (ou será em forma de letra?), o compromisso de colaborar contigo na homenagem que estás a pensar preparar ao nosso comum amigo Joaquim Castro Caldas.
E para terminar aqui fica o primeiro poema do novo livro do João Habitualmente

A minha primeira bicicleta

Foi nela que visitei o sol

E a praia. E o sal
Levou-me também às primeiras raparigas

A minha bicicleta
era o sol - e a própria viagem astral

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema VII

 Ontem não houve poema de Natal, já que tive que cumprir o ritual de um dia dedicado à cultura. Primeiro foi a apresentação do livro "O meu menino Jesus", transcrição parcial, porque mais direccionada para a juventude, do 8º poema do "Guardador de Rebanhos" de Alberto Caeiro/Fernando Pessoa, numa edição da Seara de Letras. Depois, à noite, estive no Auditório de Gaia, onde assisti à peça «Jornada para a noite» pelo Teatro Experimental.Texto fortíssimo, servido por bons actores.
Justificada a falta, vamos ao poema para hoje, do poeta David Mourão- Ferreira.

NATAL UP-TO-DATE

Em vez da consoada há um baile de  máscaras
Na filial do Banco erigiu-se um Presépio
Todos estes pastores são jovens tecnocratas
Que usarão dominó já na próxima década

Chega o rei do petróleo a fingir de Rei Mago
Chega o rei do barulho e conserva-se mudo
enquanto se não sabe ao certo o resultado
dos que vêm sondar a reacção do público

Nas palhas do curral ocultam microfones
o lajedo em redor é de pedras da lua
Rainhas de beleza hão-de vir de helicóptero
e é provável até que se apresentem nuas

Eis que surge no céu a estrela prometida
Mas é para apontar mais um supermercado
onde se vende pão já transformado em cinza
para que o ritual seja muito mais rápido

Assim a noite passa. E passa tão depressa
que a meia-noite em vós nem se demora um pouco
Só Jesus no entanto é que não comparece
Só Jesus afinal não quer nada convosco

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema VI

Trago-vos hoje um poema - um soneto - de Luis de Camões.

DOS CÉUS À TERRA

Dos Céus à Terra desce a mor Beleza
Une-se à nossa carne e fá-la nobre;
E sendo a Humanidade dantes pobre,
Hoje subida fica à mor alteza.

Busca o Senhor mais rico a mor pobreza;
Que a o mundo o seu amor descobre,
De palhas vis o corpo tenro cobre,
E por elas o mesmo Céu despreza.

Como? Deus em pobreza à terra desce.
O que é mais pobre tanto lhe contenta,
Que este somente rico lhe parece.

Pobreza este Presépio representa;
Mas tanto por ser pobre já merece,
Que quanto mais o é, mais lhe contenta.

Casa Ermelinda Freitas

Irritante, irritante, sempre. Faz as perguntas, dá as respostas. Interrompe os entrevistados com argumentos muitas vezes desajustados. Interrompe os entrevistados, fazendo novas perguntas, cortando-lhes os raciocínios. Interrompe-os sem que acabem as respostas e dá a palavra a outros. Chega a ser insolente. Sempre com um sorrizinho a bailar-lhe no rosto. Tudo isto numa só pessoa. Ainda não adivinharam quem é? Ontem no programa da RTP «Prós e Contras», em que o tema era Exercício de Cidadania, foi o exemplo acabado do mau uso da cidadania.Esta é a minha opinião. Discutível, mas minha. O seu nome actual: Fátima Campos Ferreira. Por mim podiam mandá-la entrevistar os bichos do Zoológico. Valha-nos São Pancrácio.

Nota acerca do título do texto: estava exitante à procura de um título quando na televisão passou um anúncio sobre a Casa Ermelinda Freitas (vinhos).Automaticamente escrevi-o. Deixei-o ficar, até porque os vinhos são bons.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema V

Hoje trago aqui um um pequeno, mas bonito poema, de um poeta portuense injustamente esquecido - Pedro Homemm de Mello. Um poema, que ao contrário dos antecedentes, nos fala de um Natal menos terreno e mais etéreo.

O PRESÉPIO

Duas tábuas...
E era um berço!

Estaria Deus lá dentro?

Tudo escuro...
E alumiava!

Fomos a ver...
E lá estava!

domingo, 5 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema IV

Vitorino Nemésio (os cotas lembram-se dele no programa que protagonizou na televisão durante alguns anos, «Charlas Linguísticas», se não me engano) é o autor do poema de hoje.

NATAL CHIQUE

Percorro o dia, que esmorece,
nas ruas cheias de rumor;
minha alma vã desaparece
na muita pressa e pouco amor.

Hoje é Natal. Comprei um anjo,
dos que anunciam no jornal;
mas houve um etéreo desarranjo
e o efeito em casa saiu mal.

Valeu-me um príncipe esfarrapado
a quem dão coroas no meio disto,
um moço doente, desanimado...
Só esse pobre me pareceu Cristo.

You've Got A Friend


Num dia ventoso, frio, extremamente chuvoso, em que até a luz faltou aqui na zona, durante mais de uma hora - quase ia estragando o jantar - faz bem, reconforta-nos, ouvir esta bonita balada nas vozes quentes destas divas da canção. Deliciem-se também, caros carantonhas.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema

Hoje é a vez do poeta Sebastião da Gama nos trazer a sua visão do Natal

PRESÉPIO

Nuzinho sobre as palhas,
nuzinho - e em Dezembro!
Que pintores tão cruéis,
Menino, te pintaram!

O calor do seu corpo
P'ra que o quer tua Mãe?
Tão cruéis os pintores!
(Tão injustos contigo,
Senhora!)

Só a vaca e a mula
Com seu bafo te aquecem...
- Quem as pôs na pintura?

Sebastião da Gama nasceu em Vila Nogueira de Azeitão, Setúbal. Formou-se em Filologia Românica na Universidade de Lisboa e exerceu o professorado em Lisboa, Setúbal e Estremoz. O poeta fica na história da literatura pela sua dimensão humana no convívio com os alunos. Literariamente afirmou-se pelo amor à natureza, ao ser humano.Morreu precocemente vitimado pela tuberculose.

Bichos

Isto vai de mal a pior. Estamos entregues aos bichos. Irresponsabilidade. Ausência de autoridade. Demissão na assumpção de direitos. Negação de deveres. Tudo isto se pode dizer acerca do país em que desgraçadamente vivemos. Tanto no colectivo como no individual. Do colectivo todos falamos, de preferência para criticar. Do individual, falam alguns. Ena pai, tanta conversa para chegar a Évora, pois é de Évora (eu não sei que tenho em Évora/que de Évora me estou lembrando), mais concretamente do canil da cidade, de alguns bichos lá instalados, e em especial de um bicho-homem (alguns chamam bestas aos bichos) conhecido por veterinário, (i)rresposável pelo canil que quero falar. Porque de há alguns dias para cá têm acontecido, no canil, coisas reprováveis, indignas de um ser (?) cuja missão nobre  é cuidar de animais. Mandou entanasiar cães que já estavam sob a responsabilidade de adoptantes. Proíbiu duas colegas de libertar os animais. Foi mais longe. Proíbiu-as de exercer funções. Depois, só ao fim de seis dias consentiu na libertação de um cão que havia sido apanhado na rua. Isto só depois de a dona do animal, não do bicho-homem, entenda-se, ter metido um "empenho". Tudo isto embrulhado em respostas, no mínimo mal educadas, ao ser contactado. A última vem na imprensa de hoje. Um cavalo que puxava uma carroça, ficou ferido num acidente de viação e foi levado para o canil municipal, com suspeitas de uma pata partida. Ficou sem tratamento e sem alimentação adequada, segundo um criador de cavalos que se deslocou ao canil, onde foi informado pelo único tratrador presente, que o veterinário municipal estava de férias e que mais ninguém podia cuidar ou prestar assistência ao cavalo. Pergunto: na Câmara, não haverá um superior hierárquico deste pobre bicho (não o cavalo) que lhe peça responsabilidades e o ponha a limpar os dejectos (ia chamar-lhe m...., não chamo, que a merda não merece) dos animais que ele tão mal trata? É urgente que alguém providencie ao seu afastamento. Os animais exigem-no. E sabem que mais? Valha-nos São Pancrácio. Bom domingo, caros carantonhas. 

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema III

Miguel Torga é o poeta que nos deixa hoje um dos seus poema natalícios (deixou vários sobre o tema, nos seus Diários).

NATAL

Ninguém o viu nascer.
Mas todos acreditam
Que nasceu.
É um menino e é Deus.
Na Páscoa vai morrer, já homem,
Porque entretanto cresceu
E recebeu
A missão singular
De carregar a cruz da nossa redenção.
Agora, nos cueiros da imaginação,
Sorri apenas
A quem vem,
Enquanto a Mãe,
Também imaginada,
Com ele ao colo,
Se enternece
E enternece
Os corações,
Cumplice do milagre, que acontece
Todos os anos e em todas nações.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema II

Um pequeno (grande) poema, perfeitamente actual, de um autor brasileiro, João Saraiva.

NATAL

Pobre menino Jesus!
Homens e bois te adoraram
e mais tarde, numa cruz,
homens Te martirizaram!

Vinte séculos depois
os homens não melhoraram
e ainda são mansos os bois!

Metriologia??

Nos telejornais de hoje, dos nossos canais televisivos, as condições metriológicas continuam a ser adversas. No entretanto, para se vingarem desta iliteracia militante, as condições meteorológicas pedem licença à meteorologia e regorgitam cada vez mais neve, e ó suprema vingança, gelo e ainda mais frio. Valha-nos São Pancrácio...

(Fotografia da cidade da Guarda, com neve)

E então, carantonhas com e sem frio, já ouviram falar de meteoros? Pois é daí, caros madraços, que vem a meteorologia, do grego meteóros, "que está no alto, elevado nos ares", do prefixo metá "além de" e do verbo aeírein "levantar". Usava-se na forma neutra plural (metéora) para designar os fenómenos que acontecem na atmosfera (ex: os ventos, o arco-iris, os relâmpagos e as estrelas cadentes). São estes significados que a palavra tem no português já desde o séc. XVII. Daí que a ciência que estuda os fenómenos atmosféricos para prever o tempo, se chame meteorologia

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Poema com Natal por tema

A partir de hoje, e até ao dia de Natal, vai aparecer por aqui um poema, como se diz no título, com o Natal por tema. Diariamente. Comecemos então com um poema de Fernando Pessoa, de quem passou ontem,30 de Novembro, o 75º aniversário da morte.

NATAL

Natal... Na província neva.
Nos lares aconchegados,
Um sentimento conserva
Os sentimentos passados.

Coração oposto ao mundo,
Como a família é verdade!
Meu pensamento é profundo,
Estou só e sonho saudade.

E como é branca de graça
A paisagem que não sei,
Vista de trás da vidraça
Do lar que nunca terei!

domingo, 28 de novembro de 2010

Habitualmente, João II

Volto ao João Habitualmente, porque gosto do que ele escreve - não só poesia - e que vou divulgando nos recitais que vou fazendo por aí. E porque aprecio o seu sentido de humor. Ora leiam.

AMOR É...

óleo de amendoím
óleo de milho
óleo de figado de bacalhau
óleo Fula
óleo de palma
óleo de soja
óleo de girassol
óleo need is love 

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Habitualmente, João

Foi hoje (deverá estar a ser) apresentado, nas Quintas de Leitura, - onde não estou porque os bilhetes grátis esgotaram rapidamente, - o novo livro de poesia do meu amigo José Luis Fernandes, mais conhecido pelo alter ego João Habitualmente. O livro dá pelo título de "De minha máquina com teu corpo". O João, homem divertido e um tanto ou quanto iconoclasta, faceta que já lhe vem da  juventude, é profissionalmente, psicólogo e professor na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação do Porto e investigador na área da toxicodependência. Prezo-me de ter sido o primeiro e principal divulgador da sua poesia nas extintas noites de poesia do Pinguim Café.
Aqui vos deixo com uma amostra do seu novo livro:

NU INTEGRAL

a pele cobre
a roupa tapa
tua pele de cobre
que a roupa destapa
nem a roupa já cobre
nem a pele se tapa

A fotografia do João, que ilustra este escrito, é a capa do seu livro de poesia Os Animais Antigos



sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Chuva


Tenho andado estendido na preguiceira.Sim, sim, é isso mesmo, está bem escrito, é  mesmo preguiceira. È a modos que uma metáfora, uma forma de dizer que ando com preguiça de escrever. Deve ser da chuva. Estamos no tempo, e neste momento chove. Nos vários blogues que de vez em quando consulto, a chuva é tema recorrente, o que me deu a ideia de, não escrevendo, aqui vos deixar uma chuva especial, portuguesa. Estive tentado a trazer  aqui o excelente November Rain dos Guns N'Roses, mas são nove minutos. Fica para quando houver um dia de trovoada. Agora fiquem com a também excelente Mariza. Boa música para bons ouvidos.     

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Toalha ao chão

Já atiraram a toalha ao chão. Agora o objectivo principal já é a luta pela segunda posição.
Ouvi agora mesmo o presidente da AG, afirmá-lo na RTP. É pena!

domingo, 7 de novembro de 2010

Verdade, verdadinha


Ontem. Toca a campaínha da porta. Atendo pelo intercomunicador. Uma voz feminina: "Muito boa tarde. Eu ando a falar com as pessoas. Gostava de saber a Verdade?" Respondo: " não, não, eu já conheço a verdade". E desliguei, não porque já conhecesse a verdade que ela me queria impingir, mas a verdade da hecatombe de hoje. Falo de uma teatrada feita por crianças a que hoje assisti. Que é que pensaram? Sim, porque a da noite não foi uma teatrada, foi uma tragédia. Bota pra blusa, manel...

Apetitosos

Vermelhos por fora e brancos por dentro. Coitados... até os comemos!
Como dizem os brasileiros... gossstososss.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Quartas Mal-Ditas



Aqui, digo (leio) um poema de Ruy Belo, no passado dia 6, no Clube Literário do Porto, na habitual sessão mensal das Quartas Mal-Ditas, e cujo tema foi o Outono.

domingo, 17 de outubro de 2010

Sábado à tarde


Ainda a Onda Poética da quinta-feira passada, de que vos falei. No início da sessão, foi sugerido que cada um falasse da sua memória, recente ou antiga, do cinema. Contei-lhes que a minha memória do cinema é muito antiga, esvai-se já no tempo. pois comecei a ver cinema, na minha aldeia, por volta dos meus oito anos. Como nesse tempo só se podia ir ao cinema, salvo erro com doze anos, a minha mãe levava-me "debaixo da saia" (claro que é sentido figurado) e como eu já nasci grande, chegados à porta, o porteiro, embora desconfiado, lá me deixava entrar. Interessante também é a história quer tem como figurante o tio Silva, marido da tia-avó Maria. Naquele tempo, quantos anos já lá vão, os filmes eram anunciados através de um altifalante (ou altofalente, como queiram) com a ajuda de um 78 rotações.Lembrêmo-nos que estavamos na infância do sonoro. E o disco ia até ao fim. Dizia então o tio Silva, no seu total desconhecimento da coisa, «não sei como o homem aguenta cantar tantas horas seguidas, sem se cansar». E lembro-me que o primeiro filme que vi era um musical espanhol, Violetas Imperiais, com o tenor Luis Mariano.
Carantonhas, tenham um bom domingo, com cinema e se possível sem piupocas.

sábado, 16 de outubro de 2010

O chimpanzé no cinema

Dia 14, quinta-feira. Local do "crime":Junta de Freguesia de Espinho. Actividade "criminosa": início de mais uma temporada da Onda Poética."Vítimas": poemas sobre cinema. "Arguidos" (e possíveis criminosos): elementos do colectivo Onda Poética.
Reabriu, pois, a "caça" à poesia, que se realiza uma vez por mês, sempre na segunda quinta-feira, e sempre versando um tema. Desta vez, e muito a propósito, foi o cinema, já que em Espinho se realiza todos os anos um dos mais importantes (mesmo a nível mundial) festivais de cinema de animação. Habitualmente, depois da sessão tremática, há sempre o chamado "momento dos espontâneos", onde qualquer dos presentes (também os residentes da "Onda") pode participar, dizendo, ou lendo, o que lhe aprouver. Eu li um texto de Alberto Pimenta. Ei-lo (alguns dirão eizi-o):

A EVOCAÇÃO DO CHIMPANZÉ

comprei um bilhete e um cartucho de amendoins e entrei no cinema. tu compraste um bilhete e um cartucho de amendoins e entraste no no cinema. sentámo-nos na mesma fila, lado a lado. eu abri o meu cartucho de amendoins, tu abriste o teu cartucho de amendoins, com um ruído exactamente igual ao meu. voltei-me para ti e mostrei os dentes. tu voltaste-te para mim e mostraste os dentes. quando a luz apagou, tu pousaste o teu cartucho de amendoins no colo e eu pousei o meu cartucho de amendoins no colo. com a mão direita comecei a levantar-te a saia. para me facilitar a  tarefa, tu levantaste levemente as nádegas do assento. com esse gesto, caiu-te do colo o cartucho de amendoins. assim que os amendoins acabaram de se espalhar no chão, abaixei-me para tos apanhar, mas esqueci-me do meu cartucho de amendoins, o qual me caiu igualmente ao chão. gastei um tempo enorme a procurar e a recolher todos os amendoins. lembro-me de que passei o tempo quase todo até ao intervalo recolhendo amendoins. todo o tempo tu não deixaste de suspirar e de gemer, embora estivesse apenas a decorrer um documentário sobre o narciso e nenhum drama comovente. a voz do locutor lembro-me que dizia: «no começo da primavera, quando montes e vales acordam do longo sono de inverno, centenas e centenas de narcisos elevam as douradas cabeças em todas as frestas e abrigos do solo, e lançam seu olhar inocente pelos portentosos rochedos e pelas raízes nodosas da floresta.» isto, como certamente te lembras, foi antes do intervalo. depois, quantas vezes, oh quantas vezes não deixaste cair e eu não deixei cair os amendoins que nos restavam. e ora eu, ora tu, de cada vez descíamos a procurá-los, e a colhê-los com suaves, ternos guinchos. o filme, no dizer da crítica, era daqueles que se não podem perder.

E quem é que se pode gabar, caros carantonhas, de nunca lhe ter acontecido algo parecido?

domingo, 10 de outubro de 2010

Imagine-se


Se ontem estive impedido de estar com ele, hoje já nada me impede de o trazer aqui. Se aos quarenta anos não tivesse sido cobardemente assassinado, teria cumprido ontem setenta anos de vida. Aqui fica o meu obrigado pelas belas canções que nos deixou, e pelo seu empenhamento na luta pela paz. Pelo exemplo aqui plasmado, Imagine-(se)as canções que teria escrito, se fosse vivo.

domingo, 3 de outubro de 2010

As mulheres são assim...

Por vezes desconcertantes...
Dito cá em casa, ao ver na tv o líder da oposição a perorar: -"Este rapaz veste muito bem".
Ouvido no telejornal, à saída do concerto dos U2: -"A parte estética do concerto estava muito boa"

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Dia Mundial da Música



Hoje é (ainda é) o Dia Mundial da Música. Aqui no Porto, estavam (e estão) anunciadas várias iniciativas. Por exemplo, a Metro do Porto anunciava para a estação de São Bento, a Orquestra Nacional do Porto Casa da Música, a interpretar fragmentos da 5ª Sinfonia de Beethoven. Eu estive lá,e o que é certo é que a orquestra não apareceu. Seria porque os fragmentos estavam tão fragmentados, que foi impossível juntá-los? Ou porque agora o nome da orquestra é tão comprido que demora bastante a chegar? Não sei responder. O que sei é que não ouvi a orquestra. Para compensar a minha frustração deliciem-se com o Prelúdio da Suite Holberg op.40, de Edvard Grieg.
Bom fim de semana.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Poema para acabar o dia

Tendo ainda como tema o vento, aqui fica um interessante poema de Ruy Belo,, que apesar de nos conduzir para o seu tom laudatório surpreende pelo fim inesperado.

O VALOR DO VENTO

Está hoje um dia de vento e eu gosto do vento
O vento tem entrado nos meus versos de todas as maneiras
e só entram nos meus versos as coisas de que gosto
O vento das árvores o vento dos cabelos
o vento do inverno o vento do verão
O vento é o melhor veículo que conheço
Só ele traz o perfume das flores só ele traz
a música que jaz à beira-mar em agosto
Mas só hoje soube o verdadeiro valor do vento
O vento actualmente vale oitenta escudos
Partiu-se o vidro grande da janela do meu quarto.

A fotografia que ilustra o texto, não lhe respeita directamente, é um cartaz do filme "E Tudo O Vento Levou (Gone with the wind)", de 1939, com Vivian Leigh, Clark Gable e Olivia de Haviland, que ainda hoje, 71 anos depois, continua a ser um êxito. Por isso a quis aqui.

Passem um bom dia

"O essencial é ter o vento"


Até que enfim que consegui descobrir como se transferem vídeos para o blogue. Demorou, mas com paciência...

Este vídeo é a minha participação, no passado mês de Junho, na Festa na Baixa, organizada pelo Centro Nacional de Cultura. O evento chamou-se O Som das Palavras, realizou-se no átrio da Câmara Municipal do Porto, e teve a participação da Orquestra do Norte, dos dizedores Cidália Santos, Júlio Cardoso e Amílcar Mendes,que disseram poemas de Reinaldo Ferreira, e dos jovens bailarinos Ana Anunciação e Luis Faria.
O poema de Reinaldo Ferreira:

O essencial é ter o vento

O essencial é ter o vento.

Compra-o; compra-o depressa,

A qualquer preço.

Dá por ele um princípio, uma ideia,
Uma dúzia ou mesmo dúzia e meia
Dos teus melhores amigos, mas compra-o.
Outros, menos sagazes
E mais convencionais,
Te dirão que o preciso, o urgente,
É ser o jogador mais influente
Dum trust de petróleo ou de carvão.
Eu não:
O essencial é ter o vento.
E agora que o Outono se insinua
No cadáver das folhas
Que atapeta a rua
E o grande vento afina a voz
Para requiem do Verão,
A baixa é certa.
Compra-o; mas compra-o todo,
De modo
Que não fique sopro ou brisa
Nas mãos de um concorrente
Incompetente.

domingo, 26 de setembro de 2010

Poema para acabar o dia

Hoje apetece-me, para acabar o dia, falar-vos de uma quadrilha (não de malfeitores, nem parecida com aquelas de que falo no texto anterior), mas de uma quadrilha amorosa. Então aí fica o poema de Carlos Drummond de Andrade.

QUADRILHA

"João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história."

Boa semana.

Seria bom que se entendessem

Isto, por muito que os iluminados queiram fazer crer que não, não está nada bem. Já todos o vamos sentindo. Isto, é a situação desastrosa do país. Os iluminados são os que nos governam, os seus apaniguados, mas também, e quando lhes convém, algumas figuras (eu ia a dizer figurões) da oposição. Veja-se as conversas, os discursos, agora é que vai ser, estamos de acordo, vamos salvar o país. Depois os arrufos, as zangas, as contradições, não converso mais com ele sem levar testemunhas, ele está a mentir, não senhor ele é que mente. E temos o destino do país entregue a esta gente. Seria bom, de uma vez por todas, saber quem é realmente o mentiroso. E que todos se entendessem, para de vez começarem a endireitar o que está torto. E há muita coisa que está. Esta, por exemplo: Dois indivíduos residentes em Santa Comba Dão, foram presos numa freguesia de Gaia, na posse de heroína, que tinham ido comprar ao Bairro do Aleixo. O facto nada teria de curioso, tão vulgar se tornou, não fosse o caso de ambos beneficiarem do Rendimento Social de  Inserção. Que tinham recebido no dia anterior. Quem paga a esta gente? Eu, você, todos os que procuram levar a vida honestamente. É tempo de fazer sentir a quem nos governa, que está na hora de começar a exigir que acabe esta rebaldaria.